QUANDO UTILIZAR O POTENCIAL EVOCADO MOTOR POR ESTIMULAÇÃO CORTICAL DIRETA?
Inúmeros trabalhos demonstram melhores resultados neurológicos em pacientes submetidos a abordagens neurocirúrgicas realizadas sob monitorização neurofisiológica intraoperatória em regime de anestesia geral (1-3).
A mais conhecida e difundida técnica de monitorização intraoperatória em cirurgias supratentoriais para ressecção de tumores cerebrais na proximidade da área motora primária é a realização de estimulação magnética transcraniana. Nessa técnica, faz-se a estimulação elétrica por meio de eletrodos inseridos no couro cabeludo e o registro dos potenciais motores musculares por meio de agulhas intramusculares posicionadas em diversos músculos do hemicorpo contralateral do hemisfério manipulado. O aumento das latências dos potenciais musculares >10% e a queda das amplitudes dos potenciais de ação musculares >50% em relação aos valores basais são considerados critérios de alarme para risco de déficit motor pós-operatório (4). Sabe-se, no entanto, que essa técnica apresenta uma taxa de exame falso-negativo de até 17,7% dos casos (5). Isso significa dizer que em até 17,7% dos casos a estimulação magnética transcraniana pode não apresentar qualquer anormalidade durante a cirurgia e o paciente ainda pode acordar com déficit motor.
A justificativa para isso reside no fato de a estimulação elétrica transcraniana causar despolarização neuronal em vários níveis da via motora, não sendo seletiva à região córtico-subcortical de interesse. As altas correntes podem ultrapassar o córtex motor e despolarizar a via piramidal na cápsula interna ou até mesmo no nível da decussação das pirâmides no tronco encefálico, bem abaixo do sítio de manipulação cirúrgica (vide figura 1). Por essa razão o exame pode ser normal mesmo em vigência de lesão neuronal cortico-subcortical, tornando essa técnica pouco confiável para cirurgias supratentoriais, pelo potencial risco de exame falso-negativo com consequências deletérias para os pacientes (6).
Isso não é um conceito apenas teórico, pois há inúmeros relatos de casos de pacientes submetidos a ressecção de tumores cerebrais nas proximidades da área motora e ínsula nos quais a monitorização elétrica transcraniana não demonstrou anormalidades durante a cirurgia, mas que apresentaram déficits motores significativos no pós-operatório imediato, muitas vezes de forma irreversível (7).
Dessa forma, quando a avaliação da área motora cortical é crítica, deve-se realizar outra técnica fundamental para um melhor prognóstico neurológico pós-operatório. Essa modalidade é conhecida como “estimulação cortical direta” e consiste na colocação de uma estria de eletrodos corticais (strip) diretamente sobre o córtex cerebral exposto. Essa técnica possui uma função inicialmente topográfica por permitir a localização em tempo real do sulco central mas também possui importante função prognóstica, pois permite realização de estimulação elétrica cortical direta com obtenção de potenciais motores em tempo real, sem causar movimentação do paciente, podendo ser realizada continuamente. Além disso, permite a realização de eletrocorticografia, para monitorização de atividade elétrica cortical e prevenção de crises convulsivas.
Comparada à estimulação elétrica transcraniana, quando realizada adequadamente, a estimulação cortical direta tem uma menor incidência de déficit motor pós-operatório com menores incidências de falsos-negativos, tornando a monitorização neurofisiológica mais segura (6-7) e sendo por isso a modalidade ideal para monitorização de tumores cerebrais nas proximidades da área motora.
O maior risco desta técnica é a possibilidade de desencadear crises convulsivas no intraoperatório. Entretanto, esses eventos colaterais são raros, podem ser revertidos com uso de salina fria e anticonvulsivantes, e mais importante, podem ser monitorados pela presença de pós-descargas (after-discharges) no próprio eletrodo cortical.
Por esses motivos expostos, há indicação formal de realização da estimulação cortical direta com estria de eletrodos corticais para cirurgias de tumores supratentoriais. O paciente agradece!
1. Nuwer MR, Emerson RG, Galloway G, Legatt AD, Lopez J, Minahan R, et al. : Evidence-based guideline update: intraoperative spinal monitoring with somatosensory and transcranial electrical motor evoked potentials report of the therapeutics and technology assessment subcommittee of the American Academy of Neurology and the American Clinical Neurophysiology Society. Neurology 78: 585-589, 2012
2. Holdefer RN, Skinner S A. Commentary: The value of intraoperative neurophysiological monitoring: evidence, equipoise and outcomes. J Clin Monit Comput. 2017;31(4):657-664.
3. Manninen PH, Patterson S, Lam AM, Gelb AW, Nantau WE : Evoked potential monitoring during posterior fossa aneurysm surgery: a comparison of two modalities. Can J Anaesth 41 :92-97, 1994
4. Neuloh G, Pechstein U, Cedzich C, Schramm J. Motor evoked potential monitoring with supratentorial surgery. Neurosurgery 2004;54:1061-72.
5. Colette Boex, Julien Haemmerli, Shahan Momjian, Karl Schalle. Prognostic Values of Motor Evoked Potentials in Insular, Precental, or Postcentral Resections. Journal of Clinical Neurophysiology Volume 33, Number 1, February 2016.
6. Keewon Kim, Charles Cho, Moon-suk Bang, Hyung-ik Shin, Ji-Hoon Phi, Seung-Ki Kim. Intraoperative Neurophysiological Monitoring : A Review of Techniques Used for Brain Tumor Surgery in Children. J Korean Neurosurg Soc 61 (3) : 363-375, 2018.
7. Hui Jae Do, Han Gil Seo, Byung-Mo Oh, Chul-Kee Park, Jin Wook Kim, Young Doo Choi, Seung Hak Lee. Limitation of Intraoperative Transcranial Electrical Stimulation-Motor Evoked Potential Monitoring During Brain Tumor Resection Adjacent to the Primary Motor Cortex. Ann Rehabil Med 2018;42(5):767-772 pISSN: 2234-0645 • eISSN: 2234-0653 https://doi.org/10.5535/arm.2018.42.5.767.